Cuiabá, MT - - 24 de Abril de 2024

O glamour do CSI brasileiro
03/08/2011 /
  

Durante os últimos anos, experimentamos um fenômeno que costuma ser chamado por muitos como “Efeito CSI”, traduzido em poucas palavras como uma popularização da perícia. Uma descoberta aos olhos dos leigos, um marketing que não surgiu da iniciativa daqueles diretamente envolvidos no desempenho dessa função. Emergiu da exploração da ficção de roteiros, que sempre foram mesmo bastante atraentes: desvendar mistérios, resolver casos impossíveis, buscar e encontrar a verdade, esse ente tão em falta… Não quero parecer pessimista – isso me faz lembrar a frase proferida por José Saramago: “Não sou pessimista, o mundo é que é péssimo” – mas abordar algumas das recentes notícias veiculadas na mídia, relacionadas aos serviços periciais no Brasil, nos traz um horizonte um tanto quanto perturbador no que se refere à evolução dessa atividade no país.

Nos dias de hoje a palavra perícia ganhou notoriedade, ganhou os microfones. Não se emite opinião sobre um delito ou crime, sem que se ouça: “vamos aguardar o resultado da perícia.” Mas e a realidade? Será mesmo que esse status refletiu numa evolução promovida por melhorias significativas nos serviços periciais? Vamos a alguns dados, que podem nos ajudar na condução de um raciocínio que permita emitir uma opinião embasada.

A entidade que congrega e representa os peritos criminais no Brasil, denominada Associação Brasileira de Criminalística acompanha a evolução do quadro de peritos no Brasil e calculou, com base em recomendações internacionais já consagradas, que definem como ideal a relação de 1 perito/5000 habitantes, que estamos muito distantes desses valores considerados ideais. Temos cerca de 3.600 peritos criminais oficiais, quando deveríamos ter cerca de 38.000. O reflexo dessa disparidade pode ser comprovado pela sobrecarga na demanda dos exames periciais, que muitas vezes acabam sequer sendo realizados, sobretudo no interior, ou mesmo acabam se tornando meras constatações, que quase nada acrescentam no universo probatório, se eximindo de trazer discussões e interpretações essenciais a uma boa perícia.

Num ano de cortes em todas as áreas, a perícia não ficaria de fora. Recursos outrora prometidos para diversos projetos, em parte executados, hoje são escassos, para não dizer inexistentes. Preocupante também é a crise vivida em estados como Alagoas. A mídia noticiou recentemente a crise gerada pela nomeação de um coronel da PM para dirigir os órgãos periciais do estado. O próprio Conselho Nacional de Segurança Pública – CONASP, reunido no Rio de Janeiro entre os dias 08 a 10 de junho, manifestou sua preocupação com o fato, que classificou como “retrocesso inaceitável na luta pela autonomia da perícia oficial de natureza criminal”, recomendando dentre outras, que “o Governador do estado reconsiderasse sua decisão em nomear um profissional estranho aos quadros da Perícia Oficial para o cargo de Perito Geral do Estado”. É antiga essa discussão sobre a autonomia dos órgãos periciais. Ela passa pelos âmbitos: administrativo, financeiro, técnico, científico e funcional. Importante lembrar que na 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, tanto em nível municipal, quanto estadual e nacional, foi reconhecida a necessidade de autonomia dos órgãos periciais, onde a diretriz sobre a autonomia das atividades da Perícia Oficial foi a segunda mais votada. Desnuda-se uma realidade que aparece “sob a lupa”, onde falta muito ainda para que possamos assumir o aclamado “glamour”. Faltam peritos, faltam instalações adequadas, faltam equipamentos, falta uma estratégia de remuneração adequada, falta, enfim, a disposição política de se cumprir a mera obrigação de buscar através dos bons serviços periciais uma sociedade mais justa, onde a impunidade não tenha espaço e a justiça seja feita com igualdade para todos. Por isso é preciso avançar ainda muito para suprir logisticamente a perícia, a fim de que se possa prestar um trabalho compatível com a demanda e com sua importância. * Cássio Thyone Almeida de Rosa é perito criminal da Polícia Civil do Distrito Federal, classe especial. Professor da Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, da Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e do Centro de Formação de Praças da Polícia Militar/DF

 
Autor: Cássio Thyone Almeida de Rosa
 

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