Problemas judiciais no concurso para perito criminal da Polícia Civil do Distrito Federal realizado em 2016 colocam em risco cerca de 2 mil laudos. Eles foram produzidos ao longo de um ano e quatro meses de trabalho por 15 profissionais, nomeados em dezembro de 2017, para atuar no Instituto de Criminalística (IC).
Os cargos deles são questionados devido à suspeita de irregularidades no certame. Caso as nomeações sejam anuladas, o trabalho realizado no período pode ser questionado judicialmente ou até perder a eficácia. A expectativa é de que o caso entre na pauta do Tribunal de Contas local (TCDF) até o fim desta semana.
Os questionamentos acerca do Edital nº 01, de março de 2016, para 20 vagas efetivas e 80 de cadastro reserva, começaram logo após o resultado das provas objetiva, de redação e de capacidade física. Em maio de 2017, o TCDF questionou a eliminação de candidatos posicionados além do número de vagas devido à prova de títulos. Isso os impediu de passar para a fase do curso de formação profissional.
A prova de títulos, segundo o edital, tem caráter apenas classificatório, não eliminatório. Porém, a PCDF impetrou mandado de segurança e conseguiu liminar para dar continuidade ao certame. Houve a aplicação da prova de aprendizagem, homologação do concurso e nomeação dos servidores, em dezembro de 2017.
Ano passado, o Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), no entanto, julgou o mérito da questão e cassou a liminar, declarando a nulidade de todos os atos anteriores.
“Com efeito, devem ser revistos todos os atos praticados com fundamento na liminar sem eficácia, inclusive eventuais atos de investidura no cargo público, se em desacordo com a estrita classificatória”, diz trecho do voto do relator do caso, desembargador Romeu Gonzaga, acatado por unanimidade.
De volta ao TCDF
A decisão colegiada foi encaminhada ao TCDF para que a Corte de Contas se posicione acerca da melhor forma de conduzir a situação. A previsão é de que o caso vá a plenário até a próxima quinta-feira (11/4).
O TCDF pode optar por tomar uma “decisão modulada”. O termo refere-se às ponderações a serem feitas e prejuízos mitigados. Uma das possibilidades é manter no cargo os 15 servidores nomeados. Outra, exigir que eles voltem à fase do curso de formação, o que provocaria a exoneração do cargo público. Essa última medida tornaria inválidos – ou alvos de questionamento – laudos que levaram pessoas à prisão. Os advogados poderiam desqualificar as provas nos processos.
O governo, por meio da Procuradoria-Geral do DF, emitiu parecer recomendando a realização do curso de formação somente para os três candidatos que questionaram o certame. Mas a proposta foi negada pelo TJDFT em embargos declaratórios. O TCDF também vai deliberar sobre o assunto.
Instabilidade e falta de pessoal
Enquanto isso, além da instabilidade para os servidores já nomeados e para a população, ainda são provocados transtornos para os outros candidatos que participaram do curso de formação e não foram nomeados.
“O entrave jurídico prejudica todo mundo. É triste ver a instabilidade dos colegas que estão trabalhando e de quem deixou seus estados, família e até outros empregos para fazer o curso de formação e, agora, estão desempregados. Muitos dos aprovados estão trabalhando em aplicativos de transporte, como o Uber, para sobreviver”, afirma o presidente da Associação Brasiliense de Peritos em Criminalística (ABPC), Thiago Assis.
Segundo dados oficiais da Polícia Civil, hoje a corporação tem 170 peritos, quando precisaria de ao menos 400.
“A PCDF espera que a decisão do TCDF seja no sentido de homologar a nomeação dos 15 peritos já em exercício e permitir a realização de curso de formação para mais três candidatos eliminados”, afirmou a corporação, por meio de nota.
Resolver o impasse pode aumentar os quadros de peritos, mas não resolveria o déficit. Hoje, existe um espaço destinado a eles no novo prédio do IC, localizado no complexo da Polícia Civil, mas que está subutilizado.
Reajuste travado e assembleia da categoria
As nomeações também reforçariam os quadros da corporação, insatisfeita com os salários e com a estagnação da paridade com a Polícia Federal. Nesta terça-feira (9), o Sindicato dos Policiais Civis do DF (Sinpol) realiza assembleia para deliberar sobre o assunto.
Conforme o Metrópoles noticiou em 27 de março, a mensagem presidencial que precisa ser enviada ao Congresso para os parlamentares decidirem sobre o reajuste da Polícia Civil travou na burocracia do Ministério da Economia.
Para agravar a situação, como os esforços do governo federal estão voltados para a reforma da Previdência, não há clima político sequer para encaminhar a proposta. A realidade não preocupa apenas os agentes: delegados também estão receosos.
Em 26 de fevereiro, Ibaneis entregou ao ministro da Economia, Paulo Guedes, o texto do projeto que viabiliza a paridade, mas a tramitação pouco caminhou. Naquela reunião, em 26 de fevereiro deste ano, o ministro estranhou o alto percentual de reajuste. Desde então, o tema – que passou a ser chamado de Processo n° 12100.100491/2019-67 – ficou restrito a movimentações internas na pasta. Ele passou pela Secretaria de Orçamento Federal, pelo gabinete da Fazenda e voltou para a secretaria.
Antes de ser enviado ao Congresso Nacional para apreciação, o processo deve passar por outras instâncias na Esplanada, que incluem a emissão de pareceres jurídicos. Só então o texto será remetido à Casa Civil, provável última instância antes de chegar ao Parlamento. Ainda não há definição, contudo, se a forma será projeto de lei ou medida provisória.
As articulações ocorrem em âmbito federal porque a segurança pública do DF é paga por meio de recursos do Fundo Constitucional. A reserva é abastecida pela União e leva em conta percentual sobre a receita corrente líquida do governo federal.